Depois de vários dias em casa devido à quarentena, Lucrécia debruçada na janela olhava a rua vazia e Orlando deitado no sofá assistia TV como faziam o dia inteiro todos os dias.
Eram aposentados. Não tiveram filhos. Lucrécia era infértil. Porém, a mulher sempre culpava Orlando que não discutia, estavam casados há mais de 40 anos e durante todo esse tempo foi assim, ele não dava mais a mínima para as queixas, reclamações, fofocas e insultos de sua esposa.
- Vem ver Orlando! Uma mulher parada na calçada do outro lado da rua em plena quarentena!
O homem continuou assistindo ao Jornal Nacional.
- Corre Orlando! A mulher sentou na calçada! O que será que está fazendo?
Orlando se reservou a prestar atenção na Renata Vasconcellos.
- Orlando, seu frouxo! E se for uma assaltante esperando o comparsa pra roubar a casa de velhinhos enclausurados?
- Vai roubar o quê? Não temos nada! – Resmungou o homem.
Lucrécia de olhos atentos falava sem parar.
- Orlando! E se for uma mulher com coronavírus esperando para invadir nossa casa e tossir em cima da gente! Não podemos deixar Orlando! Vou chamar a polícia!
- Que chamar a polícia que nada Lucrécia! Deixe a mulher em paz. Ela deve estar esperando alguém, deve ter marcado um encontro...
- Mas em frente nossa casa e a essa hora da noite Orlando? Mulher direita não fica esperando homem na calçada a essa hora da noite!
- Deixe a mulher em paz Lucrécia! Já ela vai embora.
- Não Orlando! Vai lá ver o que ela quer, se é contagiosa ou se é assaltante!
- Eu? Mas por que isso. Não sabe que não podemos sair de casa? E além disso, desde quando me intrometo na vida dos outros?
- É por isso que você é um banana Orlando! Não toma atitude, fica no sofá o dia inteiro. Você é um pateta Orlando!
Orlando então se levanta, veste o chinelo, um casaco e sai porta afora.
Lucrécia acompanhou da janela o marido chegando próximo à mulher. Conversaram um pouco. Sorriram e começaram a andar pela calçada.
Lucrécia nas pontas dos pés acompanhou o marido e a misteriosa mulher caminharem até o fim da rua, virarem a esquina e sumirem.
Até hoje Lucrécia espera Orlando voltar para saber se a mulher da calçada era uma assaltante, uma infectada, ou simplesmente alguém que também decidira jogar tudo para o alto, nesses tempos difíceis, em busca da felicidade.
*Jornalista, escritor e poeta, nasceu em Jacutinga (MG), possui diversos prêmios literários em vários estados e participação em importantes coletâneas de poesia, contos e crônicas. Em 2018 lançou seu primeiro livro individual intitulado “Contos Colhidos” pela editora Clube de Autores.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornal da Nova
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